sábado, 24 de maio de 2014

Investimento para competir na globalização

O papel da indústria transformadora – constrangimentos financeiros e de contexto



Síntese


  • O investimento na indústria transformadora: peso e características que a indústria deve assumir no quadro de uma transformação estrutural da actividade económica portuguesa tendo por objectivo o equilíbrio externo.
  • A reorientação da infraestrutura logística nacional: (i) do paradigma dos anos 1990 - encurtamento de distâncias dentro das nossas fronteiras - para a actualidade - o encurtamento de distâncias para os parceiros europeus; (ii) a criação de alternativa ao transporte rodoviário de mercadorias para destinos europeus.
  • O financiamento do investimento num país com o sistema financeiro debilitado e a capacidade de poupança das famílias erodida pela tributação directa e pela política de rendimentos: (i) mitigar a necessidade de servir uma dívida pública gigantesca (o Adamastor moderno); (ii) o investimento estrangeiro; (iii) o financiamento externo.


O investimento na indústria transformadora


Entre a década de 1970 e a década de 1990, a indústria portuguesa passou de uma operação em autarcia – dimensionada para o território metropolitano e colónias, com entrada de concorrentes limitada administrativamente -  para a competição aberta no espaço europeu, ampliada pelo desmantelamento de barreiras aduaneiras e administrativas a países terceiros no âmbito das conversações na OMC.

No mesmo período, o país atravessou uma revolução político-militar e duas bancarrotas.

Finalmente, no início do século XXI, o país adoptou plenamente uma moeda forte e estável – o euro.

Sendo Portugal um dos países mais pequenos da União Europeia aquando da adesão, as empresas nacionais tiveram de enfrentar uma situação de partida muito desfavorável vs. as suas congéneres de países muito maiores, com economias de escala relevantes.

Inevitavelmente, o corolário da evolução da indústria transformadora, neste enquadramento, foi a rápida perda de competitividade de muitos sectores e empresas. Ao longo da década de 2000, no período anterior ao estalar da crise financeira – 2008 – muitas empresas industriais foram encerradas em Portugal. Naturalmente, esse movimento acentuou-se desde então, por motivos conjunturais bem conhecidos.

No pós-adesão ao EEE1, as empresas industriais que sobreviveram e se desenvolveram necessitaram de adquirir rapidamente dimensão competitiva e de procurar mercados externos estáveis, embora o “grande mercado interno” apenas existisse, em grande medida, no papel, dadas as barreiras culturais e administrativas nos nossos parceiros europeus. Hoje, essa expansão está muito longe de se poder considerar concluída e foi, em muitos casos, interrompida pela escassez de financiamento na nova conjuntura “pós-crise financeira” - terceira bancarrota.

É inevitável reconhecer o peso e o potencial que a indústria de turismo têm em Portugal. É muito apelativo olhar para a nova indústria de serviços como um sector que responde muito bem às necessidades de desenvolvimento de um país com recursos naturais escassos e geograficamente excêntrico mas bem dotado de recursos humanos especializados e com capacidade de atracção e fixação de emigrantes qualificados. Mas dificilmente se atingirá, num horizonte previsível, um suficiente grau de abertura da economia portuguesa ao exterior sem uma importante expansão da indústria transformadora portuguesa vocacionada para a exportação.

Apenas para ilustrar a enormidade da tarefa: se fixarmos como objectivo de longo prazo aproximar a balança de bens do equilíbrio e tomarmos como bitola o défice apurado em 2013 – EUR 7 mil milhões, idêntico ao apurado em 1996 e menos de metade da média dos últimos 18 anos – e um VAN2 das exportações da indústria transformadora de 47,7%3, essas exportações teriam de aumentar em EUR 14,8 mil milhões p.a., ou seja, teriam de se situar 36% acima das registadas em 2011. Acresce que, mais recentemente, o mix de exportações da indústria transformadora nacional tem vindo a evoluir no sentido da degradação do VAN, ao que se soma um peso crescente de indústrias mais intensivas em capital. Esta evolução agrava, mais que proporcionalmente, as necessidades de investimento que permitiriam atingir o objectivo enunciado4.

O objectivo em questão parece adequado para assegurar um equilíbrio duradouro da balança de bens e serviços, tendo em conta que

  • o défice apurado em 2013 na balança de bens é substancialmente inferior ao normal, por força da depressão conjuntural do consumo interno;
  • o saldo positivo da balança de serviços, o qual representa essencialmente as receitas de turismo, poderá ter uma velocidade de progressão reduzida face à morosidade do investimento nessa área.


A reorientação da infraestrutura logística nacional


No início dos anos 90, com o advento dos fundos estruturais, as autoridades da área do Planeamento preocuparam-se com a promoção do reforço de infraestruturas que permitissem aproximar o interior do litoral, contribuindo para reduzir assimetrias e impedir a desertificação de áreas já atingidas pela emigração dos anos 60 e 70 e pela atractividade do litoral. Infelizmente, esta última revelou-se inexorável e a melhoria das vias de acesso de e para o interior resultou numa aceleração da migração interna que resultou no abandono das regiões que se pretendiam preservar.

No entanto, a consequência mais grave desta política não foi essa. Ao atribuir-se total prioridade à mobilidade em território nacional, deu-se continuidade à nossa autarcia, agora no plano logístico.

Em 2014, por iniciativa do actual Governo, com a colaboração da AIP, constituiu-se um grupo de trabalho tendo por missão estabelecer prioridades de investimento na infraestrutura logística nacional5, o qual produziu um relatório que aponta para uma mudança de paradigma: aproximar Portugal do centro da Europa, criando alternativas eficientes ao transporte rodoviário de mercadorias, de que se destacam as seguintes prioridades:

  • Aumento de capacidade do transporte marítimo e ferroviário;
  • Interligação portos / ferrovia;
  • Interligação ferroviária com Espanha tendo em vista ligar Portugal às principais plataformas logísticas e portos europeus;
  • Ênfase no transporte ferroviário movido a electricidade.

Este último aspecto é muito relevante: tendo em conta o forte investimento em curso por parte da EDP em novas barragens hidroeléctricas (que faz prever um excesso de capacidade instalada a médio prazo) e a subutilização pontual da nossa infraestrutura de geração eólica, o ênfase no transporte ferroviário de base eléctrica poderá ser chave para:

  • Reduzir custos de transporte de mercadorias; e / ou
  • Reduzir custos de electricidade para os consumidores industriais.

O valor dos investimentos previstos para execução no período 2014 – 2020 corresponde a EUR 5 mil milhões, dos quais EUR 2,7 mil milhões de primeira prioridade.


O financiamento do investimento: constrangimentos e soluções


A FBCF excluindo construção, em Portugal, tem decrescido desde 2009, de 7,9% para 6,6% do PIB, situando-se em 2013 em EUR 10,9 mil milhões. Deste total, estima-se que 27,2% representem a FBCF na indústria transformadora, ou seja, EUR 2,9 mil milhões, dos quais cerca de 40%, EUR 1,1 milhões, representam expansão da capacidade produtiva. No período imediatamente anterior à crise financeira, com a prevalência de condições de financiamento favoráveis, a FBCF na indústria transformadora ultrapassava EUR 4,3 mil milhões p.a.6

É muito difícil estimar o volume de investimento necessário para atingir o objectivo de crescimento das exportações de EUR 14,8 mil milhões. Se tomarmos como padrão o sector do material eléctrico, apenas para termos uma ideia grosseira de ordem de grandeza, chegaríamos a um valor de EUR 3,7 mil milhões. Se assumirmos que o investimento produtivo, mesmo dirigido à exportação, contemplará, normalmente, uma fatia de 1/3 do volume de negócios para o mercado interno, o volume de investimento a realizar ascenderá a EUR 5,5 mil milhões. Ou seja, será lícito dizer que o volume de investimento produtivo necessário para equilibrar a balança de bens terá dimensão semelhante ao que se planeia para as infraestruturas logísticas e representará, por si só, cerca de 5 anos de níveis normais de investimento produtivo na indústria transformadora.

O financiamento do investimento em infraestruturas logísticas foi previsto pelo GT IEVA como segue: fundos comunitários 54% a 61%, sector público 25%, sector privado 13% a 20%. Como é óbvio, esta estrutura não será, de todo, similar à aplicável à indústria transformadora, em que o sector privado será o actor principal.

No Inquérito de Conjuntura ao Investimento de Outubro de 2013, o INE apurou que 42,4% das empresas exportadoras, inseridas na indústria transformadora, sofriam limitações de financiamento na concretização dos seus planos de investimento, seja por falta de capital próprio seja por dificuldade de acesso ao crédito bancário. Assim, parece lícito concluir-se que uma parte importante das empresas industriais exportadoras carece de soluções de financiamento que permitam viabilizar investimentos que, sem essa limitação, seriam postos em marcha.

Dada a debilidade do sistema bancário nacional, o crescente apertar dos critérios de elegibilidade para obtenção de crédito de médio e longo prazo por parte das empresas e a necessidade de estas se capitalizarem, reforçando a sua estrutura financeira, também muito débil, considera-se que será pouco relevante o papel do sector bancário no financiamento de investimento produtivo em Portugal nos próximos anos. 

Face à conjuntura de depressão da poupança privada nacional, por força da excessiva carga fiscal directa e de uma política de rendimentos muito restritiva, impõe-se:

  • a contenção da despesa pública, excluindo salários e pensões7 (nomeadamente, através de legislação limitativa da despesa em % do PIB); e
  • o recurso ao financiamento externo do investimento.

Quanto a este último, perspectiva-se que possa assumir as seguintes formas:

  • fundos comunitários8;
  • crédito concedido por instituições financeiras de desenvolvimento (e. g. BEI, KFW);
  • investimento estrangeiro no mercado de valores mobiliários; e
  • investimento directo estrangeiro.

Se estimarmos o investimento produtivo total a concretizar entre 2014 e 2020 em EUR 25,8 mil milhões (EUR 5,5 mil milhões para expansão das  capacidade exportadora e EUR 2,9 mil milhões p.a. correspondentes ao investimento regular na indústria transformadora), os fundos comunitários do QCA 2014-2020 poderão cobrir até 24% do total a investir. O investimento directo estrangeiro (líquido) na indústria transformadora em Portugal ascendeu em 2012-13 a EUR 800 milhões p.a., o que corresponderia a 21% do total a investir no período do novo QCA. O restante financiamento (cerca de 55%) teria de provir das demais fontes, tendo presente que:


  • o acesso das empresas industriais portuguesas ao mercado de valores mobiliários dependerá, em boa medida, da sua capacidade de crescimento (risco de círculo vicioso);
  • não existe ainda experiência em Portugal na actuação de instituições financeiras de desenvolvimento, na configuração perspectivada para o futuro “banco de fomento”.


Pode-se, portanto, concluir que os riscos de insuficiência de financiamento para executar o investimento produtivo necessário para equilibrar duradouramente a balança de bens e serviços são muito elevados, devendo por isso merecer a máxima atenção das autoridades.

Notas:

Espaço Económico Europeu.
Valor Acrescentado Nacional (grau de incorporação nacional). Em média, para se exportar 1 euro importam-se 0,523 euro.
3 VAN médio das exportações da indústria transformadora em 2005. Fonte: BMEP n.º 03/2011 – GEE / GPEARI
4 E, curiosamente (ou não), contradiz a tese da recuperação da competitividade baseada em redução de custos salariais.
5 O GT IEVA – Grupo de Trabalho para as Infraestruturas de Elevado Valor Acrescentado.
6 Estimativa a preços de 2007.
7 Por razões de transparência política e proteção do património dos contribuintes, as receitas e despesas do sistema público contributivo de pensões deveriam ser segregadas das contas públicas, evitando a sua classificação orçamental, quer como receita pública, quer como “despesa social”.
8 QCA 2014-2020, OT 3 – dotação de EUR 6,2 mil milhões.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Crisis? What Crisis? (Parte VI) - Crise e Coesão na Europa - A Plasticidade Intelectual do Sr. Barroso

Do lúcido fim da austeridade num dia ao seu cego contrário no seguinte, entremeado por declarações acintosas de um parlamentar alemão que terão sensibilizado profundamente o Sr. Presidente da Comissão Europeia, levando-o a humilhar-se e retractar-se publicamente, por escrito, com assinalável contrição. Case study para os clínicos especialistas em problemas da cervical. De facto, nesse particular, e estritamente no plano intelectual, o Sr. Barroso parece mais próximo da invertebrada lesma do que do comum homo sapiens. Nunca pensei ter saudades do cherne...

É tempo de reformar as instituições europeias, tornando estes personagens de triste figura (que me perdoe Miguel de Cervantes, são bem piores do que D. Quijote) directamente responsabilizáveis perante os cidadãos.

Crisis? What Crisis? (Parte V) - Estratégia para o Crescimento, Emprego e Fomento Industrial

O Programa que o Sr. Ministro da Economia recentemente apresentou - e que se deveria, mais modestamente, designar de Revitalização da Economia Portuguesa - consiste num conjunto de programas operacionais e não constitui, não se insere, nem contém, um Plano Estratégico para a economia portuguesa. É insuficiente, com eficácia potencialmente mitigada pela inexistência de visão estratégica e de enquadramento em Política Económica (da responsabilidade directa do Sr. ministro Gaspar que, aparentemente, se quis alhear aos olhos do público do Programa agora apresentado). Apesar de tudo, constitui um anúncio de intenções que revelam ainda existir, no Governo, uma réstea de vontade de corrigir o rumo.

Um dos programas consiste em instruir a CGD a reforçar o crédito às PMEs em EUR 3,5 mil milhões em 2013-14. Só quem não conhece bem o sector bancário é que pode ter a ingenuidade de querer misturar um modelo de gestão baseado em critérios de rentabilidade / risco idênticos aos utilizados no sector privado com orientações de concessão de crédito "à bruta". O resultado será, muito provavelmente, o cumprimento estritamente formal das orientações do Sr. Ministro, sem qualquer repercussão significativa na economia real. Sugere-se que o Governo pondere, em alternativa, adicionar ao programa divulgado uma iniciativa de Funding for Lending: a experiência inglesa é positiva e foi recentemente alargada e reforçada pelo Bank of England, em articulação com o Tesouro. Não é directamente transponível, dada a nossa dependência do BCE enquanto Banco Central, mas pode ser adaptada para Portugal. Ou seja, apesar da incapacidade de emissão monetária do Banco de Portugal, pode-se disponibilizar aos bancos portugueses a verba de EUR 6 mil  milhões que sobrou dos fundos do Memorando da Troika alocados à recapitalização da banca nacional, mediante a subscrição pelo Estado de obrigações emitidas por esses bancos contra a apresentação, por estes, de cessões de créditos sobre empresas nacionais produtoras de bens transaccionáveis. Esta medida nem sequer implicaria qualquer renegociação do Memorando, dado que a subscrição de obrigações emitidas pelos bancos é qualificável como reforço de capital, de acordo com os critérios de Basileia que orientam a mensuração da autonomia financeira do sector. Seria bem mais eficaz do que tentar obrigar a CGD, "pelas orelhas", a reforçar o crédito às PMEs.

Crisis? What Crisis? (Parte IV) - Psi - Letra grega, símbolo matemático ou epíteto da desgraça nacional?

O PSI para Portugal. De letra grega utilizada como símbolo matemático a sigla de Private Sector Involvement que, em termos objectivos, já significou a renegociação da dívida pública grega, implicando forte desvalorização  desta (mais de 70%). Novidade pré-anunciada pelo Sr. Presidente do ECOFIN, aquele jovem Sr. ministro das Finanças holandês com nome impronunciável mas especiais capacidades de comunicação mediática, à margem das Conferências de Verão do FMI em Nova Iorque. As declarações que produz aos jornalistas, atabalhoadamente, são sempre tão verdadeiras quanto inoportunas.

É notável a capacidade de indiscrição e boicote desajeitado do Presidente do ECOFIN, em momento crítico para Portugal, em paralelo e em simultâneo com iniciativas do Ministro das Finanças de Portugal, à mesma hora e no mesmo local, para  viabilizar a colocação particular de uma emissão de Obrigações do Tesouro a 10 anos. Como se sabe, esta emissão é absolutamente essencial para enquadrar Portugal na iniciativa Draghi que permitirá ao BCE intervir nos mercados secundários de dívida soberana, única possibilidade de regresso sustentado aos mercados no caso português.

É também assinalável e sintomático que tal anúncio seja feito, em primeira mão, pelo Presidente do ECOFIN, em tom nonchalant, numa matéria que é, antes de mais, de interesse português e só subsidiariamente se poderia considerar de sua competência. Revela bem a completa falta de respeito do Sr. ministro da Finanças da Holanda pelo nosso país.

É ainda interessante realçar a falta de atenção dos políticos portugueses sobre este assunto. Se da parte do Governo podemos interpretar este silêncio como um sinal de prudência, tentando que passem o mais despercebidas possível declarações prejudiciais para Portugal, da parte da oposição trata-se de pura incompetência e inacção - estavam distraídos...

Logo veremos o que este PSI significará para os detentores de dívida pública portuguesa, sendo de recear forte impacto na solvabilidade dos bancos portugueses. Esperemos que haja o bom senso de restringir esse PSI às emissões de dívida anteriores a Maio de 2011 e que o Governo tenha a elementar preocupação de  dele preservar as emissões de títulos destinados à pequena poupança: Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro.

A "Caras" que se prepare, pois iremos ter Charles Dallara, todo moreno após estadia balnear no Pontal em finais de Agosto, de regresso a Portugal no início do Outono para se integrar em nova negociação de perdão de dívida "mediterrânica". Será o Outono Financeiro Português?...

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Crisis? What Crisis? (Parte III) - Quando Portugal tomou o rumo da Grécia...





Rescaldo da reunião de ontem da Comissão Permanente: como se previa, o PSD "meteu o rabinho entre as pernas". Claramente, não há consenso interno e o próprio Dr. Passos Coelho já está "na berlinda". Foi particularmente interessante ver o Dr. Luís Filipe Menezes, pleno de killer instinct, apelar à remodelação governamental.

Os meus cenários para o desenvolvimento da crise política no curto / médio prazo (de ontem à tarde, ainda antes da reunião da Comissão Permanente do PSD que, como era expectável, nada modificou):


Remodelação do Governo - versão 1


Terá por objectivo justificar o recuo quanto às alterações na TSU, responsabilizando alguém pessoalmente (prática equivalente, no nosso tempo, às execuções públicas que eram norma desde a Idade Média até ao séc. XIX, organizadas para gáudio da populaça).

Vítima mais provável: o "ideólogo", parteiro da polémica Medida, e principal econocrata (gostaram do léxico?) do Governo - não podendo ser Passos Coelho, o que faria automaticamente cair o Executivo, lá terá de ser supliciado o Dr. Gaspar. Pode levar junto, a título de bónus, o "Dr." Relvas.


Remodelação do Governo - versão 2

O Dr. Passos Coelho não aceita recuar quanto à TSU e exige pública profissão de fé dos "hereges" (membros do Governo indicados pelo CDS); caso contrário, fogueira com eles (leia-se, demissão desses Ministros e Secretários de Estado relapsos).

Os ministros centristas abandonam o Governo e a coligação passa a ser sustentada, exclusivamente, num Acordo de Incidência Parlamentar.

Tratar-se-ia de manobra kamikaze por parte do PSD, mas já vimos por diversas vezes, desde Maio de 2010, o Dr. Passos Coelho dar sinais de uma irresistível atracção pelo abismo (leia-se, no caso concreto, queda do Governo e perda da liderança do PSD - a ordem dos factores é arbitrária, em termos de precedência no tempo).

Recordo a carta que enviei ao Dr Passos Coelho, capeando um fósforo e respectiva lixa, quando ele, ao lado do Eng.º Sócrates, sentiu uma irreprimível necessidade de se imolar politicamente, exprimindo pública solidariedade com o então Chefe do Governo socialista. Será que lhe devo enviar agora uma outra, capeando um isqueiro? Ou espero que, à la Clint Eastwood, ele, inevitavelmente, faça um novo pronunciamento ao país, em tom grave e ameaçador, do género "Make my day..."?...

Apesar do timbre jocoso deste desabafo, vejo a situação com muita preocupação e alguma amargura: o Dr. Passos Coelho, a abarrotar de irreflexão, teimosia e falta de sentido de oportunidade, catalisado pela cega e diligente cumplicidade económetro-dogmática (mais criatividade lexical, Saussure oblige) do Dr. Gaspar, pode ter deitado a perder dezasseis meses de estóicos sacrifícios da nossa gente portuguesa que, apesar de tudo, estavam a permitir que o País atingisse as metas cruciais para o restabelecimento da sua soberania financeira.

É pena.